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O Leffest não fechou os olhos a Víctor Erice

Luís Miguel Oliveira

O prémio de Melhor Filme na secção competitiva do Leffest 2023, atribuído por um júri composto por Elia Suleiman, Fanny Ardant, Khalik Allah, Georgi Gospodinov, Nitin Sawhney, Rachel Kushner e Adriana Molder, foi entregue a Cerrar los Ojos, do espanhol Víctor Erice. O festival dirigido por Paulo Branco teve neste sábado a noite do palmarés e encerra neste domingo, dia ainda com projecção de filmes.

Era difícil, de facto, escapar à majestade assombrada da primeira longa-metragem “convencional” de Erice em 30 anos (descontando, portanto, as curtas-metragens ou a correspondência fílmica com Abbas Kiarostami, que o ocuparam neste período), um filme que, para mais, é como um contentor, que recebe ecos da obra anterior do cineasta (O Espírito da Colmeia, El Sur, O Sol do Marmeleiro) mas também está cheio — como os “filmes-fantasma” de Jacques Rivette — de reverberações dos filmes que Erice quis fazer mas não pôde fazer (como, e é quase explicitado em Cerrar los Ojos, uma adaptação de O Feitiço de Xangai, de Juan Marsé).

É a história de um actor que desapareceu subitamente nos anos 1990, a meio de uma rodagem, e do realizador e amigo que, 30 anos depois, lhe tenta reencontrar o rasto — e ocasião, neste aparato narrativo, para uma reflexão sobre os restos da cinefilia, sobre o que lhe aconteceu neste buraco temporal. O filme chega às salas comerciais portuguesas a 7 de Dezembro.

Andou bem o júri, também, quando atribuiu o Grande Prémio João Bénard da Costa a Los Delincuentes, do argentino Rodrigo Moreno, um exemplar do “novo cinema argentino”, aparentado com o Trenque Lauquen de Laura Citarella recentemente estreado por cá. Com o de Erice, o filme de Moreno, uma história do acossamento da classe média argentina a partir da história de um bancário que desfalca o banco em que trabalha, cheia de ecos de Bresson (e especificamente, de L’ Argent), formava facilmente o par de melhores filmes presentes na competição. E os que vinham logo a seguir também foram contemplados: Prémio do Júri para Do Not Expect to Much From the End of the World, do romeno Radu Jude, e Menção Especial para Le Procès Goldman, do francês Cédric Kahn.

O palmarés compõe-se com um prémio de interpretação: um prémio especial para a actriz Bianca Delbravo, uma das garotas adolescentes de Paradise is Burning, da sueca Mika Gustafson.

Cultura

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2023-11-19T08:00:00.0000000Z

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