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Doentes a recuperar de cancro terão regime transitório de IRS

Mesmo recuperando capacidade, cidadãos podem continuar a deduzir ao IRS uma certa quantia nos quatro anos seguintes à revisão médica. É necessário que a incapacidade seja igual ou superior a 20%

Pedro Crisóstomo

O grupo parlamentar do PS apresentou uma proposta de alteração à versão original do Orçamento do Estado (OE) para 2024 para atenuar o imbróglio fiscal vivido pelos doentes com cancro e outros cidadãos com um grau de incapacidade igual ou superior a 60% quando, depois da reavaliação médica, passam a ter um grau de incapacidade menor.

A bancada socialista propõe que, nos quatro anos seguintes àquele em que há revisão do atestado multiusos, os cidadãos continuem a beneficiar de uma redução parcial do IRS, embora numa dimensão inferior à da fase em que reuniam os requisitos legais para acederem ao incentivo para doentes com grande incapacidade.

Nesses quatro anos seguintes à reavaliação, os cidadãos continuarão a contar com uma dedução à colecta do IRS relativa às pessoas com deficiência, desde que mantenham “uma incapacidade igual ou superior a 20%”.

A parcela a subtrair ao IRS a pagar será progressivamente inferior de ano para ano. No “ano subsequente ao processo de revisão ou reavaliação de incapacidade que resulte na atribuição de grau de incapacidade inferior a 60%”, a dedução será equivalente ao valor de dois Indexante dos Apoios Sociais (IAS) — para se ter uma ideia, em 2024 a dedução seria de 1020 euros, porque o IAS do próximo ano será, de acordo com o Governo, de 510 euros. Há uma redução relativamente à regra aplicada durante os anos em que a incapacidade é inferior a 60%, porque, nessa altura, a quantia a deduzir corresponde a quatro vezes o IAS (2040 euros em 2024).

No segundo ano após a reavaliação, a dedução baixa para 1,5 IAS (765 euros, assumindo o valor de referência que aí vem); no terceiro, diminui para o equivalente a um IAS (510 euros); no quarto, para meio IAS (255 euros).

Neste momento, os doentes têm um IRS mais baixo não apenas por esta via, mas também porque há uma parte do rendimento que está excluída de tributação de IRS (para quem é trabalhador, só contam para o IRS 85% dos rendimentos e, no caso dos pensionistas, 90%). Relativamente a essa parte do benefício fiscal, não há qualquer regra transitória. A proposta do PS apenas diz respeito à vertente das deduções à colecta (e, dentro desta, também não estende a regra segundo a qual os doentes com grande incapacidade podem deduzir à colecta do IRS 30% das “despesas efectuadas com a educação e a reabilitação” do próprio, ou 25% dos prémios de seguros de vida).

A questão do IRS dos doentes com cancro tem causado conflito entre os contribuintes e o fisco (e tensão entre a administração fiscal e alguns grupos parlamentares, PCP e BE, por causa da forma como o fisco interpreta a lei).

Queixas

A partir de 2019, alguns cidadãos foram-se queixando aos grupos parlamentares de que estavam a ser prejudicados a nível fiscal pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) quando iam a uma junta médica fazer a reavaliação pela forma como os serviços do fisco interpretavam a lei. O Parlamento acabou por aprovar em 2021 uma alteração legislativa para assegurar que se um cidadão, ao fim dos cinco anos do atestado, passasse a ter um grau de incapacidade inferior aos 60%, continuaria a beneficiar do tratamento mais favorável. Se da avaliação resultasse a perda de direitos ou de benefícios já reconhecidos, mantinha-se “em vigor o resultado da avaliação anterior”, sendo exigido que a patologia clínica fosse a mesma e desde que o contribuinte não fosse prejudicado a nível fiscal.

Mas, mesmo depois desta alteração, a tensão manteve-se, porque o fisco tem considerado que, sendo o IRS um imposto de natureza anual, o tratamento mais favorável só se aplica no ano em que se verifica a reavaliação, mas não nos anos posteriores em que os cidadãos já recuperaram uma parte do grau de capacidade.

A proposta que o PS apresenta não altera esta regra, apenas se centra na fase seguinte àquela em que os doentes deixam de reunir os requisitos previstos na lei para beneficiarem do incentivo fiscal.

Além de as queixas dos cidadãos terem chegado a grupos parlamentares, também a provedora de Justiça foi recebendo queixas, uma das quais apresentada pela associação Mama Help, que apoia doentes com cancro da mama.

Alteração Ao Orçamento Do Estado Economia

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2023-11-20T08:00:00.0000000Z

2023-11-20T08:00:00.0000000Z

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