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Ucrânia ganha terreno na margem oriental do Dniepre e avança oito quilómetros

Forças russas obrigadas a recuar após Kiev ter instalado cabeças-de-ponte que permitem o transporte de soldados e veículos

Paulo Narigão Reis

A transposição do rio Dniepre pelas forças ucranianas na última semana marcou um avanço significativo numa guerra que chegara a um impasse, mesmo que os dois lados não o quisessem admitir. Agora, devidamente instalada na margem oriental do curso de água que tem servido como divisória natural na frente de batalha no Sudeste do país, a tropa ucraniana passou ao ataque e já terá forçado os soldados russos a recuarem oito quilómetros.

“Os números preliminares variam entre três e oito quilómetros, dependendo das características específicas, da geografia e da topografia da margem esquerda”, afirmou no sábado Natalia Humeniuk, porta-voz do Comando Operacional Sul do Exército ucraniano à televisão estatal. Se este avanço se confirmar, será a maior investida das forças ucranianas contra o inimigo desde há vários meses.

O estabelecimento de cabeças-de-ponte pela Ucrânia na “margem russa” do Dniepre representa um pequeno mas potencialmente significativo avanço estratégico, mesmo que a tropa de Moscovo esteja a vender caro o recuo no terreno. A mesma porta-voz afirmou que os soldados ucranianos tinham repelido 12 ataques do Exército russo entre sexta-feira e sábado.

Os ucranianos estão agora a tentar “fazer recuar as unidades do Exército russo tanto quanto possível, a fim de facilitar a vida a quem vive na margem (ocidental) da região de Kherson, para que sejam menos bombardeadas”, disse Humeniuk, acrescentando que os russos tentaram impedir o avanço com a utilização de “aviação táctica”, incluindo os drones explosivos Shahed, de fabrico iraniano, para tentar imobilizar as forças ucranianas.

Desde que se retiraram, em Novembro do ano passado, da cidade de Kherson e recuaram para a margem oriental do Dniepre, um dos maiores rios da Europa que atravessa a Ucrânia de norte a sul, as forças russas têm bombardeado regularmente as posições militares — e as comunidades — do lado ucraniano do rio para impedir que os soldados de Kiev avancem em direcção à Crimeia, anexada ilegalmente pela Rússia em 2014.

“O inimigo continua a disparar artilharia”, disse a porta-voz, estimando o número de soldados russos naquela área em “várias dezenas de milhares”. “Temos muito trabalho a fazer”, acrescentou Humeniuk.

Até este mês, a muito aguardada contra-ofensiva da Ucrânia não cumprira as expectativas depositadas não só pelo Governo de Kiev como pelos aliados ocidentais. Numa entrevista recente à revista The Economist,o responsável máximo pelo Exército ucraniano, o general Valery Zaluzhny, lamentava que, em vários meses, os soldados sob o seu comando só tivessem avançado 17 quilómetros na região do Donbass, afirmando que o conflito iniciado em Fevereiro de 2022 se encontrava numa “postura posicional”.

As palavras de Zaluzhny não caíram bem ao Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky. Com estes comentários, “torna-se mais fácil o trabalho do agressor”, afirmou Ihor Zhovkva, vice-chefe de gabinete de Zelensky, no início do mês.

O último grande êxito reivindicado pela Ucrânia na sua contra-ofensiva tinha sido, até agora, a reconquista da aldeia de Robotyne, em Agosto, na região meridional de Zaporijjia.

Kiev esperava que esta reconquista lhe permitisse romper as linhas russas e libertar as áreas ocupadas, mas o Exército ucraniano foi incapaz de o fazer face ao poder de fogo russo e às sólidas linhas de defesa, nomeadamente os campos de minas colocados pelo inimigo.

Agora, já com os dois pés na margem oriental do rio Dniepre, Kiev poderá pensar em levar avante um assalto de maiores proporções no Sul da Ucrânia, para o qual precisará de deslocar um grande número de homens, veículos e outro equipamento. Um objectivo que, todavia, a chegada do Inverno poderá complicar, até por causa das características do terreno, arenoso e pantanoso.

Drones sobre Kiev

Se Kiev pode cantar (algum) sucesso na zona de Kherson, os bombardeamentos russos continuam a não dar descanso aos militares e aos civis ucranianos, incluindo na capital. Kiev foi alvo na madrugada de ontem de várias vagas de ataques com recurso a drones, o que aconteceu pela segunda noite consecutiva.

“Os UAV (veículos aéreos não tripulados) do inimigo foram lançados em muitos grupos e atacaram Kiev em ondas, a partir de diferentes direcções, ao mesmo tempo que mudavam constantemente os vectores de movimento ao longo da rota”, informou Serhiy Popko, chefe da administração militar de Kiev, na aplicação de mensagens Telegram.

A Força Aérea da Ucrânia afirmou, por sua vez, que os seus sistemas de defesa antiaérea destruíram 15 dos 20 drones Shahed de fabrico iraniano lançados pela Rússia sobre as regiões de Kiev, Poltava e Cherkasy. Não houve relatos iniciais de “danos críticos” ou vítimas, disse Popko, acrescentando que pelo menos uma dezena de drones foi abatida sobre Kiev e nos arredores. O governador da região de Cherkasy, Ihor Taburets, disse no Telegram que os destroços danificaram “ligeiramente” cinco casas, mas não houve feridos.

O Governo de Kiev poderá pensar agora em levar avante um assalto de maiores proporções no Sul da Ucrânia

Guerra Na Ucrânia

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2023-11-20T08:00:00.0000000Z

2023-11-20T08:00:00.0000000Z

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