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Centeno não cede a pressões e quer ficar até ao fim do mandato no BdP

Marcelo ligou a Centeno para lhe dar uma palavra de conforto na quinta-feira, dia 9, depois de anunciar ao país que recusava nomear novo primeiro-ministro e que iria haver eleições antecipadas

David Santiago

A pressão para que Mário Centeno deixe as funções de governador do Banco de Portugal (BdP) não demoveu a intenção do antigo ministro das Finanças de concluir o mandato iniciado em Julho de 2020, sabe o PÚBLICO. O ex-presidente do Eurogrupo quer continuar ao leme do banco central, pelo menos, até ao Verão de 2025, altura em que termina o actual mandato.

Já quanto a um eventual segundo (e último) mandato, ao que o PÚBLICO apurou, o ex-presidente do Eurogrupo não afasta a possibilidade. Mas será sempre uma decisão bipolar: que depende, desde logo, da sua vontade pessoal, mas também das intenções do Governo em funções quando a questão se colocar.

Se for o PSD a liderar o Governo em 2025, é muito improvável que Centeno seja reconduzido. Os sociais-democratas já se opuseram à passagem directa do Ministério das Finanças para o BdP e, agora, surfaram a onda de pedidos de demissão, considerando que Centeno “perdeu a legitimidade para ser governador”.

A posição de Mário Centeno enquanto governador do BdP começou a ser posta em causa depois de o primeiro-ministro ter revelado – pouco depois de o Presidente da República ter anunciado a realização de legislativas antecipadas – que propusera a Marcelo Rebelo de Sousa o nome do antigo titular das Finanças – que aceitara reflectir – para o cargo de primeiro-ministro.

Mas esta é só a versão “livro de bolso”. Pelo meio, e entretanto, houve versões contraditórias e desmentidos: quem convidou Centeno e qual a resposta deste ao convite; avaliações à conduta do governador; pedidos de demissão por falta de independência e de continuidade pela sua qualidade; ou ainda a declamação de parte de um poema.

Com o PSD à cabeça, os partidos à direita exigiram a demissão do governador, e à esquerda do PS optaram por aguardar pela avaliação que seria feita pela comissão de ética do BdP.

O resultado dessa avaliação chegou na passada quarta-feira. A comissão concluiu que Centeno “agiu com a reserva exigível naquelas concretas circunstâncias, cumprindo os seus deveres gerais de conduta”, ainda que “os desenvolvimentos políticomediáticos” registados possam “trazer danos à imagem do banco”.

Conclusões reportadas ao Banco Central Europeu, mas que não deverão ter consequências de maior, até porque, diz o estatuto do BCE, “um governador só pode ser demitido das suas funções se deixar de preencher os requisitos necessários ao exercício das mesmas ou se tiver cometido falta grave”. Ora, a avaliação da comissão de ética do BdP não parece apontar nesse sentido.

Já os líderes dos principais bancos a operar em Portugal consideram não só que a independência de Centeno não está em causa devido à sondagem para ser primeiro-ministro, como sublinham a importância de garantir estabilidade ao sistema.

Na conferência organizada, esta quinta-feira, pelo Jornal de Negócios em que ouviu elogios dos banqueiros, Mário Centeno citou versos de um poema de David Mourão-Ferreira, intitulado Abandono, o que gerou leituras de que o governador estaria a ensaiar uma espécie de despedida.

Mas não, o antigo ministro pretende continuar governador e, nesse mesmo dia, em declarações à agência Bloomberg, assegurou não ter quaisquer ambições políticas. Isto é, quis frisar que a sua única ambição é continuar no BdP.

Marcelo confortou Centeno

Perante a crise política suscitada pelo seu pedido de demissão – prontamente aceite por Marcelo –, António Costa defendeu dar continuidade à actual maioria socialista com um nome credível, e internacionalmente reconhecido, na chefia do Governo. Evitando assim a incerteza inerente à marcação de eleições.

O Presidente da República rejeitou tal cenário e optou por eleições antecipadas. Para Costa, Marcelo escolheu seguir um caminho que o “país não merece”.

No sábado da semana passada, já depois de o PÚBLICO ter noticiado que Costa convidara Centeno com a concordância de Marcelo e que o governador mostrara disponibilidade em nome do interesse nacional, o primeiro-ministro demissionário esclareceu: “Quando apresentei a proposta conhecia que o professor Mário Centeno só daria resposta definitiva depois de falar com o Presidente, de conhecer as condições de governabilidade (…). As conversas não prosseguiram e nunca houve uma resposta definitiva.”

No dia 13, Centeno acrescenta, ao Financial Times, ter recebido o convite da parte “do Presidente e do primeiro-ministro para reflectir e considerar a possibilidade de liderar o Governo”.

Horas depois é desmentido por Marcelo — que diz ao FT não ter convidado ninguém —, o que leva Centeno a corrigir as suas próprias declarações: “É inequívoco que o senhor Presidente da República não me convidou para chefiar o Governo.”

Segundo as informações recolhidas pelo PÚBLICO, Mário Centeno mostrou abertura para assumir o executivo, porém não chegou a dar uma resposta final. Antes de as suas dúvidas ficarem esclarecidas, o chefe de Estado falou ao país para anunciar eleições e lembrar os problemas observados em 2004 na solução de continuidade que levou Santana Lopes ao poder.

Foi para explicar isso mesmo e para lhe dar uma palavra de conforto que, ainda nessa noite de quinta-feira, dia 9, Marcelo telefonou a Centeno — foi a primeira e única vez que falaram em todo este processo.

Política Governador Foi Sugerido Por Costa Para Pr

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2023-11-19T08:00:00.0000000Z

2023-11-19T08:00:00.0000000Z

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