Moratória de capital criada pelo Governo permite reduzir prestação em 13%
Bonificação de juros alargada até 800 euros por ano, perto de 67 euros por mês, valor que pode esgotar-se em menos de ano. A amortização de capital sem custos estará em vigor até final de 2024
Rosa Soares
Depois de as taxas de juro terem subido mais do que o esperado, acima dos 4% nos prazos mais utilizados no crédito à habitação (a seis e 12 meses), gerando grandes constrangimentos financeiros às famílias e levando outras a equacionar avançar para a venda das casas, o Governo alterou as medidas que podem reduzir um pouco as prestações da casa.
Uma delas é a criação de uma moratória de capital, que passará a ser obrigatoriamente disponibilizada pelos bancos a todos os particulares, de forma a ultrapassar “a resistência” de algumas instituições bancárias em ajudar as famílias com soluções abrangentes. A outra é o reforço da bonificação de juros, que apenas se aplica aos particulares com crédito à habitação com rendimentos mais baixos, até ao sexto escalão do IRS (38.632 euros brutos anuais).
As duas medidas só se aplicam a quem tem empréstimos a taxas variáveis, ou seja, associadas às taxas Euribor. A moratória de crédito tem a duração de dois anos e a bonificação de juros estende-se até ao final de 2024.
A nova medida referente à redução de juros estará disponível a 2 Novembro e as candidaturas poderão ser feitas até ao final de Março de 2024. Os bancos terão 15 dias para responder às solicitações dos clientes, desta vez com propostas concretas, o que nem sempre aconteceu.
Se no caso da bonificação de juros, cujas alterações foram ontem aprovadas em Conselho de Ministros, existe uma simplificação e um reforço no apoio, já na medida que permite um “congelamento” da prestação o modelo é bastante mais complexo e a redução da prestação a pagar pode ficar-se apenas por cerca de 13%, de acordo com os exemplos apresentados pelo ministro das Finanças.
É certo que Fernando Medina disse que a moratória de capital — designação que se justifica pelo facto de a redução da prestação ser feita pela suspensão de parte da amortização de capital e não da componente dos juros — pode ser combinada com outras soluções que as instituições
financeiras possam disponibilizar aos clientes, de forma a reduzir ainda mais as prestações. Mas essa possibilidade depende da boa vontade dos bancos e a experiência demonstrada até agora é que ela não tem sido muito grande, com algumas entidades a impor apenas uma ou duas soluções e até a limitá-las temporariamente a 12 meses, quando o cenário era, e ainda é, de agravamento das prestações. Como o PÚBLICO noticiou recentemente, há famílias que já renegociaram os contratos e, devido às actualizações posteriores, já estão no limite da capacidade de pagamento.
Um aspecto positivo é a possibilidade de conjugação da bonificação de juros com a moratória de capital, mas o universo de potenciais beneficiários fica mais reduzido.
Na moratória de crédito, a medida desenhada pelo Governo, Banco de Portugal e Associação Portuguesa de Bancos estabelece um limite à taxa Euribor, que para o cálculo das futuras prestações será de 70% do actual valor da Euribor a seis meses, actualmente nos 4%. É sobre aquele limite que vai ser calculada a prestação da casa, mas a redução incide apenas na parte correspondente ao capital, que será pago mais tarde. O valor dos juros será pago integralmente, e ao valor da taxa de mercado.
Mas se é considerado 70% do indexante, sobrando 30%, como é que a redução da prestação é de apenas 13%? Precisamente porque a redução incide apenas na parte de capital. O exemplo apresentado pelo titular do Ministério das Finanças mostra isso mesmo. Um empréstimo de 200 mil euros, a 30 anos, com a Euribor a seis meses de 4,1%, e um spread (margem comercial do banco) de 1,5%, vai corresponder a uma prestação mensal de 1148,15 euros. Com a aplicação do limite de 70% ao valor do indexante (passa a 2,85%), a prestação tem uma redução de 152,65 euros, para 995,50 euros, ou menos 13%. Apesar da redução, o valor da prestação pode continuar a ser incomportável para muitas famílias.
A redução da prestação é maior nos casos em que as duas medidas se puderem cruzar. Ainda de acordo com um exemplo avançado por Fernando Medina, agora para um empréstimo de 100 mil euros, com a Euribor a seis meses (reduzida de 4,1% para 2,85%), a 30 anos, spread de 1,5% e taxa de esforço de 40%, o crédito vai ter uma redução da prestação de 574,08 euros (sem as medidas) para 431 euros. Trata-se de uma redução de 143 euros mensais, o equivalente a menos 25%.
Complexidade no futuro
Precisamos de assegurar uma resposta em que as famílias ganhem um horizonte de confiança
Fernando Medina Ministro das Finanças
Se, no presente, é clara a redução da prestação, a compensação, no
futuro, dessa redução é bem mais complexa e implica custos, apesar de o Governo assegurar que “não há aumento da dívida dos particulares”.
O pagamento do capital não amortizado à taxa de mercado, ou sem a redução imposta ao indexante, vai ser pago mais tarde, sendo diluído durante o prazo do contrato. Mas esse pagamento só começará a ser feito a partir do sexto ano em que termina o regime especial, incidindo sobre os juros que estiverem em vigor no futuro.
Este calendário cria uma situação em que o cliente paga uma prestação mais baixa durante dois anos, depois passa a pagar a prestação que resultar da taxa em vigor durante quatro anos e só no sexto é que vai ver a prestação subir ligeiramente pelo início do pagamento de capital que, entretanto, ficou congelado.
Bonificação de juros
Na medida relativa à bonificação de juros, destinada a famílias com rendimentos mais baixos, há um prolongamento da medida até final de 2024 (inicialmente terminava em 2023) e o reforço para os 800 euros (720 euros, actualmente), mas esse valor pode ser rapidamente esgotado. Ou seja, não poderá ultrapassar os 66,70 euros por mês (60 euros anteriormente) para chegar ao limite de um ano.
No entanto, este apoio é ligeiramente reforçado e simplificado, uma vez que a bonificação incide sobre o montante de juros que exceder os 3% da taxa Euribor, deixando de considerar a taxa inicialmente contratada ou a taxa de stress. Por outro lado, a bonificação será de 100% do valor que ficar acima dos 3%, isto para os agregados que apresentem uma taxa de esforço igual ou superior a 50%, e de 75% para quem tem taxa de esforço superior a 35% e abaixo de 50%.
Há ainda uma terceira medida, que é o prolongamento da suspensão da comissão de reembolso na amortização de capital, total ou parcial, dos empréstimos à habitação, até ao final de 2024. A suspensão desta comissão (de 0,5% sobre o montante a amortizar) “pode ser prolongada ou mesmo integrada na legislação”, anunciou o ministro das Finanças.
Destaque Crise Na Habitação
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2023-09-22T07:00:00.0000000Z
2023-09-22T07:00:00.0000000Z
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