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Há mar e mar, há a praia e o seu bar

tece de 10 de Junho a 12 de Setembro —, um privilégio efémero que vai conquistando cada vez mais adeptos e AEdelizando turistas.

Encontrámo-lo no limite norte de Moledo, junto ao pinhal do Camarido — e só arranjamos estacionamento perto porque o vento nos deu uma ajuda. “Tanto está aqui um surAEsta como um ministro”, aponta António, há três anos gerente de um espaço que já aqui tinha algumas raízes. “Moledo é uma zona mais recatada e tranquila, menos turística do que o Sul”, apregoa este especialista em cibersegurança que às tantas AEcou “farto de estar em frente aos computadores”. “Queria algo diferente, perto da praia e sazonal.”

Encontrou o Vapor, onde, para o nosso bem, continua a exercitar uma grande paixão, a música electrónica. Enquanto o sol vai alto, é natural por aqui ouvirmos samba e bossa nova, “Thievery [Corporation] e Kruger [& Dorfmeister]”, diz o ex-produtor que nasceu na vizinha Vila Praia de Âncora, e um deep house ao AEm do dia, altura em que o Sol se põe entre o forte da Ínsua e Santa Tecla e os banhistas, se a nortada o permitir, estão de copo na mão espalhados pela esplanada ou sentados nas toalhas de olhos postos na linha do horizonte. Mal termina a época balnear, António partilha através das redes sociais a playlist do Spotify com os hits do Verão — mas, à cautela, mais vale instalar o Shazam.

O Vapor orgulha-se de servir “o AEno de praia mais barato de Portugal” (custa um euro) e aponta como especialidade da casa os mojitos (cinco euros, meio litro). Também serve muitas caipirinhas e esporadicamente abre um barril de cerveja artesanal — ou não fosse o Artbeerfest orgulhosamente de Caminha. “Temos vendido mais de cem garrafas de rum por semana e 44 barris de 50 litros de cerveja. É tipo festival de Verão!” Não há petiscos de relevo, mas não faltam opções tradicionais nas redondezas.

Para além dos quatros esses essenciais para a vida de um turista — de sea, sun, sand e surf —, já há muitos estrangeiros que se AExam nas praias do Norte atraídos pelo vento, fonte de energia inesgotável para o kitesurf, do contacto directo com a natureza e das praias mais reservadas, sem hordas de banhistas. De uma ou de outra forma, o telefone de António Vaz (e o da irmã Francisca) não pára de receber mensagens. “Está um dia de ventinho”, vai avisando com a devida antecedência. “Para trazer cá um DJ, por exemplo, tem que ser muito em cima da hora, três dias antes”, diz.

Em Portugal o despontar das estâncias balneares começou a meio do século XIX quando se propagou

o discurso médico sobre a importância da água salgada para a saúde. Junte-se um par de prescrições: boa música e um mojito ao pôr do Sol. Luís Octávio Costa

Vapor

Praia de Moledo

Instagram: https://www. instagram.com/vaporbeachbar/ Aberto até dia 12 de Setembro Preços: fino 1€; mojito e francesinha a 5€

Serra, Póvoa de Varzim A irredutível garrafeira poveira

Se nos sentarmos no farol, pousado na areia de Aver-o-Mar, alguém nos contará histórias de epopeias e do pequeno porto de pesca que aqui existia (antes de os últimos pescadores terem passado para o porto principal da Póvoa). Já não há vestígios das medas de sargaço e o outro farol — sim, existe outro farol — foi engolido por prédios numa imagem que bem pode ser o protótipo da especulação ou apenas uma das muitas originalidades da nossa mutante costa.

Tudo muda, com a excepção de uma irredutível garrafeira poveira — precisamente entre faróis —, que não se deixa dominar pelo progresso e cuja única alteração nas últimas décadas são camadas sobre camadas de caixas e caixas de vinho, como camadas do solo que aos poucos, ano após ano, década atrás de década, vai escondendo a matéria orgânica e enterrando a história.

A “rocha-mãe” era — ou ainda é e será sempre — a pastelaria Serra, “um nome conceituado na Póvoa” gerido durante três gerações já desaparecidas. José Gonçalves trabalha na casa, entre faróis, há 41 anos. Já era funcionário e há 34 anos tomou conta do estabelecimento, que sempre funcionou como uma espécie de AElial da pastelaria que AEcava na airosa Praça do Almada, nas proximidades do coreto. “Agora está lá um banco”, conta José, que tanto trabalhava na Póvoa como aqui.

A “camada” seguinte diz-nos que esta Serra da vila de Aver-o-Mar ainda funcionou uns anos como pastelaria antes de perceber que para resistir tinha que se adaptar. Aproveitou o encerramento de uma garrafeira vizinha (”que não teve grande sucesso”) e a mudança de instalações do Manjar das Francesinhas (para Terroso) e deixou os bolos para terceiro plano. Primeiro está o vinho, depois as francesinhas poveiras e os pregos e só depois é que vêm os jesuítas.

“Eu já tinha o bichinho das garrafas. Na Praça do Almada já tinha colecções, Portos e aguardentes. Pensei ‘vou mudar; vale-me mais comprar AEambre e pão’.”

Os clientes da casa dirão que está tudo praticamente no seu estado primitivo, que nada mudou, que o espaço sempre foi exíguo e que as divisões das duas salas sempre foram deAEnidas pelo volume de caixas de vinho e barris de cerveja que se deslocam daqui para ali, que a caixa de bolos frescos sempre esteve equilibrada no meio da sala com ar de armazém vivo e que as chapas (a “carburar” das 10h às 21h) nunca chegaram a arrefecer.

“As marcas são muitas, a oferta é muita e os vendedores são muitos. E ainda há a minha curiosidade de ter de tudo o que me é possível ter...”, procura justiAEcar o gerente deste negócio familiar (divide as tarefas com a esposa Salvina) engolido por móveis antigos à pinha de garrafas a fazer lembrar os bares de canto que nos anos de 1980 os emigrantes portugueses trouxeram para as suas casas na terra natal. “Não sei quem os fez, mas conhecia o carpinteiro que dava assistência à casa.”

Desde 1980 que o maior armário de garrafas tapa tanto os azulejos Çoridos como as janelinhas que davam para o mar. “Tive que as tapar para encostar móveis. Está tudo... como vê... não tenho armazém, nunca consegui um cantinho para fazer uma limpeza à sala”, diz José Gonçalves, “minhoto de Fafe” que prefere não se sentar para a conversa com a

Fugas. “O meu trabalho é de pé.”

“Ao todo”, estamos rodeados por “umas 150 marcas de vinho”. José explica a organização desorganizada. “É fácil: só tenho que memorizar onde estão as garrafas”. Tem “mais Douro”, mas também um pouco de Alentejo, Dão e Bairrada. E faz questão de ter miniaturas porque “ainda há muitos coleccionadores” — assim como clientes que pedem uma colheita de um ano especíAEco que coincida com o aniversário de um familiar: “’Para o meu pai, que é de 59’”. “É a melhor garrafeira da Póvoa e arredores”, apregoa um cliente, de copo na mão.

Na casa Serra não cabe um único epíteto. “Ultimamente chamo-lhe snack bar garrafeira Serra, mas a Pastelaria Serra nunca vai deixar de existir!” O número de polícia está na Avenida dos Pescadores, 640, mas todos entram pela Rua do Farol, que depois da renovação da avenida “AEcou assim, como uma rua sem saída”. Dá para o farol junto ao mar e para os passadiços pejados de locais, turistas, emigrantes e caminhantes de Santiago. A outra porta, da sala que até podia ser mais ampla, “já não se abre há não sei quantos anos”.

Está lá uma família rodeada de caixas a lambuzar-se com pregos (”gasto do talho Rosmaninho desde que estou aqui”). Para além da francesinha poveira (pão de cachorro, linguiça, AEambre, queijo e respectivos molhos, mais ketchup e mostarda), também se serve bola de carne “de qualidade”, queijo e marmelada ou apenas o queijo a transbordar do pão ligeiramente torrado a estalar e um copo de vinho.

Lá fora, com vista para os dois faróis, estão quatro mesinhas ao sol “para o desenrasque”. “Fomos ganhando terreno ao mar”, exclama José. Resiste esta Serra. L.O.C.

Snack bar garrafeira Serra

Rua do Farol, Aver-o-Mar Horário: das 10h às 00h (fecha à terça-feira)

Preços: vinho a copo (1,70€), prego (3,10€) e francesinha poveira (3€)

Bares De Praia

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2022-08-06T07:00:00.0000000Z

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https://ereader.publico.pt/article/281492165082513

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