Público Edição Digital

Orlinski: uma estrela da nossa era

Jakub Józef OrliŚski & Il pomo d’oro

★★★★★

Com Francesco Corti (cravo e direcção musical). Porto. Teatro Municipal Rivoli — Grande Auditório. 25/03. às 19h30. Sala cheia.

O agrupamento il Pomo d’Oro é um valor seguro que dispensa apresentações e, embora seja frequente vê-lo trabalhar com cantores, o papel que desempenha no programa que agora trouxe a Portugal para dois concertos de homenagem a Jorge Gil (1943-2019) é claramente o de acompanhar o contratenor polaco Jakub Józef Orlinski (Varsóvia, 1990).

No sábado, perante uma sala cheia, Orlinski confirmou o que já se suspeitava: além de um cantor com uma técnica muito sólida, é um “animal de palco”, uma estrela dominante que se dirige ao público com a mesma segurança e simpatia a cantar ou a falar.

No programa, não houve grandes surpresas: o disco Facce d’amore (Parlophone, 2019) forneceu a matéria para todo o concerto, seguindo um alinhamento um pouco diferente e com algumas ausências (não foram interpretadas as árias Sempre a si vaghi rai, de J. A. Hasse, e Ah! stigie larve, de Händel, nem se escutou a percussão do Ballo dei Bagatellieri, de N. Matteis).

Ainda que algum polimento próprio dos registos discográficos se tenha perdido, as acrobacias mais arriscadas de Orlinski compensaramno em absoluto. Algumas consistiram muito simplesmente em longos decrescendos que culminaram com inesperados crescendos súbitos, como na ária Odio, vendetta, amor, do Don Chisciotte (1719), de Francesco Bartolomeu Conti, ou em ornamentadas improvisações que exibiram o seu domínio vocal, numa extensão bastante generosa e equilibrada. Porém, porque as receitas de sucesso não necessitam de ser aperfeiçoadas, algumas das pequenas brincadeiras que o contratenor apresenta como graças espontâneas são repetições de momentos experimentados em concertos anteriores. Mas não será igualmente válida esta arte da ilusão, tanto mais que Orlinski atrai para o repertório vocal um público novo, mais interessado na culto da estrela do que na própria música (e que, atrás disso, poderá constituir-se público para outras músicas)?

A jovialidade com que se dirigiu ao público, falando, com a mesma graça, sobre o programa — que combina árias divulgadíssimas com outras menos conhecidas — ou sobre o fato que veste — desenhado para o programa Facce d’amore —, terão ajudado à total rendição de um Rivoli cheio, que aplaudiu de pé, após a animada ária Che m’ami ti prega.

Aludindo aos outros álbuns que testemunham a profícua colaboração de Orlinski com o agrupamento il Pomo d’Oro — Anima Aeterna (2021) e Anima Sacra (2018) —, dois números extra-programa foram oferecidos ao reconhecido público: Gratias agimus tibi, do compositor napolitano que morreu em Lisboa, depois de servir a corte portuguesa, David Perez (1711-1778), e Alla gente Dio diletta, de Francesco Nicola Fago (1677-1745).

Uma das melhores formas de prestar homenagem a Jorge Gil será continuar a produção, em Portugal, de concertos singulares com o elevado nível deste Facce d’amore, que hoje, às 21h, se ouvirá de novo no Centro Cultural de Belém. Diana Ferreira

Cultura

pt-pt

2023-03-27T07:00:00.0000000Z

2023-03-27T07:00:00.0000000Z

https://ereader.publico.pt/article/281934547200991

Publico